Embora pareça ser senso comum sugerir que comer menos reduzirá o risco de engordar, essa pode não ser a melhor abordagem. A obesidade exige uma abordagem mais sofisticada do que a contagem de calorias: ela precisa ser tratada como um tópico interdisciplinar. Aqueles que dão conselhos psicológicos precisam estar cientes dos aspectos tanto da fisiologia quanto da nutrição.
A natureza interdisciplinar da obesidade exige que sejam consideradas as interações entre fisiologia, ambiente e psicologia. Mais especificamente, argumenta-se que ter uma redução na ingestão de calorias como o ponto central de uma estratégia de anti-obesidade falha em reconhecer a existência de mecanismos fisiológicos que predispõem ao seu fracasso, visto que uma menor ingestão de energia leva a alterações hormonais que estimulam o apetite, reduz a taxa metabólica e estimula o consumo de alimentos mais calóricos.
COMO O CORPO RESPONDE A UMA PEQUENA MUNDANÇA NO CONTEÚDO CALÓRICO DAS REFEIÇÕES?
Antes de concluir que a redução do consumo energético das refeições terá influência, essas mudanças precisam ser colocadas no contexto de uma ampla gama de fatores sociais e psicológicos. Até mesmo porque palatabilidade, fome, sede, euforia e ansiedade influenciam o consumo alimentar.
Uma sugestão simplista é que qualquer aumento da ingestão de calorias inevitavelmente resultará em um aumento no peso corporal. No entanto, mesmo se este fosse o caso, o impacto da redução do consumo de energia de alguns itens alimentares será limitado pela grande influência de muitas variáveis sociais e psicológicas. O impacto será ainda menor se, ao longo do tempo, houver mecanismos que suavizem as variações do consumo diário de calorias no dia-a-dia.
Reduzindo o tamanho das refeições
Estudos experimentais onde as calorias foram removidas da dieta sem o participante ter conhecimento dessa redução, mostraram que qualquer peso perdido tende a ser recuperado rapidamente. É essencial, se você deseja demonstrar uma resposta à mudança do conteúdo calórico dos alimentos, que os estudos sejam realizados cegamente: participar conscientemente de um estudo produz mudanças gerais no comportamento. Logo, se a ingestão de calorias é reduzida, o corpo compensa diminuindo sua taxa metabólica ou estimulando a ingestão de alimentos.
REGULAÇÃO A LONGO PRAZO DO CONSUMO DE ENERGIA
Fazendo dieta
A perda de peso induzida por dieta resulta em mudanças de longo prazo nos hormônios intestinais do apetite, o que favorece o aumento do apetite e o reganho de peso. Existem outras alterações fisiológicas. Quando a ingestão de alimentos era restrita, a perda de gordura corporal resultante estava associada a uma diminuição na produção de calor corporal e a uma redução na taxa metabólica, mudanças que facilitarão o retorno ao peso inicial. Dadas essas respostas à dieta, não é de surpreender que tenha sido proposto que, no longo prazo, isso não funcione, qualquer peso perdido tende a não ser mantido. Isso ocorro porque o organismo tende a buscar a manutenção do peso atual, sem alterações bruscas.
Obesidade
O presente argumento de que existem mecanismos que ao longo do tempo buscam manter o peso corporal existente levanta uma questão: se esse é o caso, por que há uma epidemia de obesidade? Existem vários fatores contributivos.
Em primeiro lugar, a obesidade geralmente reflete um ou dois quilos (0,5 a 1 kg) por ano durante décadas: isto é, há um controle muito bom, embora não perfeito, do balanço energético. Em segundo lugar, a natureza da dieta inteira é importante. Para evitar a compensação de energia, alimentos de baixa densidade energética devem ser consumidos. No entanto, muitas dietas ocidentais têm uma alta densidade de energia que rapidamente compensa qualquer redução no consumo de energia. Em terceiro lugar, em muitas sociedades ocidentais, um importante preditor da obesidade é a pobreza. A pobreza está associada a um baixo gasto com alimentos, uma baixa ingestão de frutas e verduras e um alto consumo de gordura. Os alimentos mais baratos tendem a ter alta densidade energética.
Além disso, para controlar o peso deve-se ser possível tanto perder peso quanto manter essa perda. Muitas vezes não comemos porque estamos com fome, mas porque é hora da refeição; não escolhermos o que comer, mas comemos o que é preparado; comemos o tamanho de porções determinado pelo estabelecimento ou pelo produto industrializado. Como tal, a oportunidade de equilibrar o consumo e o gasto de energia pode ser limitada.
SE NÃO FOR REDUÇÃO CALÓRICA, QUE ESTRATÉGIA DEVEMOS UTILIZAR?
Se não houver controle consciente da ingestão de calorias, o corpo simplesmente recuperará a energia perdida. Além disso, é improvável que pequenas mudanças na dieta reduzam a incidência de obesidade, já que o controle do peso corporal geralmente exigirá uma reformulação completa da dieta. No entanto, parece provável que concentrar-se na natureza do alimento consumido, em vez de simplesmente reduzir as calorias, ofereça vantagens. Uma abordagem que considere em conjunto os macro-nutrientes, a densidade de energia e a carga glicêmica pode ajudar a prevenir a compensação de energia.
Dietas que ajudam na perda de peso
Há relatos de que o apetite, o controle do peso corporal e a compensação de energia são influenciados pela composição de macronutrientes das refeições (quantidade de gordura, carboidrato e proteína). Assim, uma dieta de baixa densidade energética (ou seja, oferece menos calorias por grama de alimento) tem duas vantagens: diminui a ingestão de energia, mas também ajuda a manter qualquer perda de peso; isso porque consumimos mais ou menos o mesmo volume de alimentos, mas com um menor teor de calorias. Alimentos de baixa densidade energética tendem a ter um alto nível de água e um baixo teor de gordura; frutas e legumes são bons exemplos. Além disso, estudos mostram que comer alimentos que contenham mais proteína, fibra e água resulta em sentir maior saciedade após uma refeição, enquanto o conteúdo de gordura tem um impacto oposto.
No entanto, em vez de se concentrar especificamente nas propriedades dos alimentos individuais, deve-se lembrar que o padrão habitual de alimentação é o que predispõe à obesidade. Assim, deve-se encorajar o consumo de dietas com menor risco de levarem à recuperação de peso. Isso, no entanto, envolve outras considerações além de simplesmente reduzir a ingestão de calorias.
DISCUSSÃO
Em resumo, uma prioridade de curto prazo do corpo é equilibrar os extremos de ingestão de energia que ocorrem de refeição em refeição. Como tal, pequenas mudanças na ingestão calórica são improváveis de terem um impacto de longo prazo. Um segundo objetivo do corpo, após uma perda de peso, é garantir o retorno ao peso corporal pré-existente. Embora os mecanismos fisiológicos que favorecem a manutenção do peso corporal sejam poderosos, eles não são inabaláveis. Deve-se avaliar aspectos ambientais e mudanças de comportamento que possam modificar o impacto destes mecanismos fisiológicos.
Os psicólogos precisam passar mais tempo fora do laboratório, pois esse local não reflete a maioria dos fatores que determinam o ganho de peso. O mais robusto dos fenômenos laboratoriais pode não sobreviver ao interagir com os fatores ambientais e de comportamento que influenciam a tendência de engordar. É fácil propor que a pessoa deva manter um novo peso menor, mas isso é difícil de alcançar. Existem centenas de dietas diferentes, a maioria das quais será até certo ponto bem sucedida, pelo menos por um curto período. Logo, o objetivo deve ser entender os fatores que impedem a recuperação do peso.
A principal tarefa é desenvolver estratégias que incentivem mudanças comportamentais que percebam os benefícios de um estilo de vida adequado. Mudanças na dieta farão parte, mas um estilo de vida apropriado e traços de personalidade úteis também precisam ser encorajados.
Conclusão
Em resumo, qualquer estratégia bem sucedida para controle de peso precisa adotar uma abordagem mais ampla e de longo prazo do que apenas estudar a ingestão de calorias. E embora os mecanismos de controle do peso sejam poderosos, entender como eles funcionam pode ser útil, ao invés de simplesmente reduzir as calorias, entender a influência dos alimentos consumidos na satisfação, saciedade e compensação de energia pode ser vantajoso.
** PONTO DE VISTA 449 **
A questão do emagrecimento é algo muito complexo que realmente vai além da contagem calórica, o processo deve ser visto como uma mudança de hábito!
Novos hábitos devem ser criados, novos alimentos devem ser colocados na rotina e maus hábitos, que levaram ao excesso de peso, aos poucos devem ser abandonados.
Na Ciência da Nutrição temos estudos que estabelecem necessidades diárias, sejam de nutrientes ou de calorias. Não devemos jogar tudo pro alto e acreditar que estabelecer uma ingestão calórica diária é uma perda de tempo para quem quer emagrecer.
A restrição calórica severa realmente não traz benefício algum, mas a moderação no consumo calórico faz parte do processo de mudança de hábito.
Essa moderação, como o texto sugere, pode simplesmente ocorrer com a inclusão de novos alimentos com menor densidade energética, como frutas, legumes, frutas e cereais integrais por exemplo.
É importante identificar o perfil da pessoa que inicia o processo de emagrecimento. Alguns indivíduos realmente não têm boa adesão a uma rotina muito controlada, que seja muito restrita ao hábito que o levou ao excesso de peso. Já outros conseguem e precisam de uma rotina para serem disciplinados. Para os que não conseguem, a primeira abordagem não deve ser muito restrita, e com o passar do tempo, de acordo com os resultados, deve ser feita uma negociação para evoluir na intervenção nutricional.
Seja para pessoas que toleram uma rotina controlada ou não, criá-la a curto ou longo prazo, com uma distribuição adequada dos alimentos ao longo do dia faz parte da crição de um novo hábito de vida, que deixará a pessoa longe do excesso de peso.
Como é colocado no texto, restrições calóricas são compensadas depois de alguns dias com mudanças hormonais que farão com que o organismo procure compensar, aumentando a ingestão de alimentos para voltar ao padrão anterior. Não ter uma rotina alimentar controlada fará com que o indivíduo possa ficar à mercê dessas compensações, já que na tentativa de emagrecer ele comerá menos em alguns dias do que outros.
Assim como treinamento físico, que temos planilhas de corrida que estabelecem uma rotina de estímulos ao longo da semana e dos treinos, na nutrição é importante ter uma "planilha de alimentação" com uma rotina de alimentação que estabeleça horários, alimentos e os estímulos necessários para a mudança corporal.
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Artigo analisado pela estagiária Marina Senhorinho (1º semestre/2018)
Reducing Calorie Intake May Not Help You Lose Body Weight - Perspectives on Psychological Science, 2017.